Daniel Campos

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Carta de inverno

Se eu, minha querida,
Soubesse que você pegaria o último vôo
Do inverno
Com destino ao que não lhe destina
Eu jamais teria a deixado
Partir...
Mas eu não sabia
Soube disso dias atrás
Quando me dei conta
De que o inverno acabou
Que a primavera não veio
Por uma razão ainda não conhecida...
Ai, é tão frio pensar
Que o verão é só o ardume
De uma estrela de 4,5 bilhão de anos
E você, toda dona de si,
Nem me avisou
Que seu signo é Hiroshima
No zodíaco
Transcendental...
Ai, depois daquele inverno
Quanta destruição
Quanta seqüela
Quantos dramas
Mais dramáticos
Do que nossas encenações
Ao pé da cama...
Devia ter lhe fechado
Devia ter lhe trancado
Devia ter lhe trancafiado
Mas o sêmen da minha poesia
Lhe deu asas...
Nem foi preciso o primeiro vento lhe chamar
A janela do primeiro andar já foi tentadora o suficiente
Você voou ainda naquele céu manchado
De inverno
E eu só me dei conta de tudo isso dias atrás
Quando os modistas me fizeram olhar para o próximo inverno
O próximo!
Você voou
E eu não posso revogar nada
Afinal, revista todas as contas
Fui eu quem lhe fiz assim
Tão calada quão alada...


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