14/10/2013 - Último pedido
Quando eu morrer, que me cremem. Sou claustrofóbico demais para passar anos dentro de um caixão enterrado a sete palmos. Além disso, não gosto de cemitérios. É muito silêncio, muito choro, muita dor. Nunca sonhei em ter uma cova, uma lápide, um jazigo. Não sou planta de batata que precisa ser enterrada para brotar. Sou de ser semeado sobre a terra mesmo. Já viu alguém enterrando um poema, ainda mais um poema verde?
Ah, e que minhas cinzas sejam jogadas em alguma mata. Nada de guardarem a minha versão pó em uma urna. Quero ser lançado sobre algo verde, e com a devida urgência. Pode ser em um bosque, em um jardim, em um quintal... sob a sombra de um pé de mangueira ou jabuticabeira, minhas árvores e frutas favoritas. Porém, nada contra abacateiros, pitangueiras, goiabeiras, limoeiros... plantações de girassol, algodão, alfazema...
Se quiserem me lançar em uma mata de riacho, também vou ficar muito agradecido. E não importem se for dia de vento, pois talvez alguém venha me buscar. Também não adiem o momento por conta da chuva, pois não há nada que eu ame mais do que um dia chuvoso. Nada de abrir buraco para colocar as cinzas. Basta jogar, de punhado em punhado ou de uma só vez o que restou de mim. Devolvam-me, sem pena ou pesar, ao meu lugar.
No dia de finados ou no aniversário de minha morte não precisa que ninguém volte ao lugar que me lançaram para me visitar, acender velas e ascender rezas. Nesses dias se querem me homenagear, plantem uma árvore. Eu sou verde. Eu sou do verde. E se não tiverem recursos para me cremarem, queimem o que restou de mim em uma fogueira de São João, com direito a bandeirolas e arrasta-pé. Só, por favor, não me enterrem.
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