29/05/2008 - Síndrome do avestruz
Hoje acordei com a síndrome do avestruz. Vontade de enterrar minha cabeça na terra e ficar ali para sempre. Vontade de lançar por terra todos meus sonhos, todos meus pensamentos, todos meus horizontes. Quem saiba por entre os vermes do submundo eu me sinta melhor. Ah! Que o sol e a lua desapareçam depois de um beijo apaixonado. Eu estarei cá em minha escuridão mais profunda e não testemunharei a morte de nenhuma estrela. Vou enfiar a cabeça na terra e não tomar conhecimento do que acontece a minha volta. E esse gesto não é por medo, mas por necessidade. O mundo não me cabe, ou melhor, eu não caibo nesse mundo.
Com a cabeça enterrada na terra eu estarei, de certa forma, no meio daquela terra fria cumprindo a promessa bíblica de voltar ao pó. Talvez nasça, ou melhor, brote um novo eu desse corpo em degeneração. Fincarei minha cabeça na terra como quem finca suas raízes. E, no meu caso, minhas raízes são as poesias que povoam meu cérebro. E, se for da vontade dos deuses, que homens ou mulheres cortem meus brotos com machados ou foices, extinguindo-me de uma vez por todas. Se for para tombar, que eu o faça sem que meu caráter e meus ideais sejam deturpados pela realidade insólita que caminha a passos largos infestando cada fresta, cada poro, cada átomo existente fora e dentro de nós.
Como avestruz, assumo o meu fracasso. Sou pesado demais para alçar vôo e ganhar os altos-céus. Sou desengonçado demais para ser tema de dança, como os cisnes. Sou desafinado para entoar o canto dos rouxinóis. Sou caro demais para ser alimento no prato dos mais pobres. Por ironia da evolução, sou antes ou depois do meu tempo. Só me resta enfiar a cabeça na terra e não mais ver, ouvir, sentir. Quem sabe assim, quando um dia, se meu destino permitir, eu tirar a cabeça da terra eu possa testemunhar um outro mundo. Um mundo, no mínimo, habitável para meus sentimentos.
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