Daniel Campos

Imprimir Enviar para amigo
29/10/2010 - Saudade pescadora

Perto do ribeirão havia uma saudade pescadora. Ela molhava os pés, lançava sua rede à solidão e pergunta ao vento: quem és tu que eu não te vejo? A saudade trançava fios de rede e destino e navegava pelos rios salgados do oceano sem ter direção ou plano. Acendia suas velas, conversava com orixás, abria suas velas, voava em feitio de sabiá do mar. E quando ia puxar sua rede não achava nada, só um monte de lembrança embaraçada e um vazio que dava corrupio no seu coração.

Pobre saudade pescadora, ferida pelos anzóis da ausência. Por mais que se esforçasse e força botasse não conseguia jogar sua rede a ponto de alcançar a distância necessária para aliviar seu mal. Mais do que distância de espaço, a saudade sofria de distância temporal. Quanto tempo se passou do começo ao final de sua existência sem que houvesse meio. O meio se perdeu em algum lugar daquelas águas que voltam. Águas correntes. Águas passadas.

Saudade pescadora que corre da cabeceira até o deságüe do riacho sem achar isca nem pescado. Saudade de enrosco, que vai assoreando o rio com seu alvoroço. Saudade gaivota, que canta sempre numa só nota. Saudade que leva e traz seu barco farto de ninguém. Saudade pescadora, olhos de salmoura. Saudade pescadora, drama de escamas. Saudade pescadora, flor de espinhas. Saudade pescadora, pecadora de amor.

Saudade ribeirinha, não sabe se é tua ou se é minha.


Comentários

Nenhum comentário.


Escreva um comentário

Participe de um diálogo comigo e com outros leitores. Não faça comentários que não tenham relação com este texto ou que contenha conteúdo calunioso, difamatório, injurioso, racista, de incitação à violência ou a qualquer ilegalidade. Eu me resguardo no direito de remover comentários que não respeitem isto.
Agradeço sua participação e colaboração.

voltar