Salve-se quem puder
A música do plantão jornalístico da Globo invade os ouvidos. A voz de Fátima Bernardes diz que o primeiro de três porta-aviões norte-americanos chega ao litoral que já foi das caravelas de Pedro Álvares Cabral. Primeiro, como no Oriente Médio, os bombardeios. Depois, as tropas terrestres. A tão frágil democracia brasileira espalhada em zilhões de cacos. O que é isso??? O Brasil atacado por alienígenas? O trailler do novo filme de Spilbergh? Não, o Brasil tomado pelos "sem". Tudo quanto é tipo de sem: "sem-teto", "sem-terra", "sem-privilégio", "sem-sucesso", "sem-cheque especial", "sem-vergonha"...
Na mídia, os bastidores do duelo principal: Bush, o caçador de terroristas, e Stedile, o representante do movimento dos "sem" mais organizado até então, o MST. Mísseis depois, Stedile se esconderia como um Sadam tropical. Os fogos se espalhariam pelo céu escuro como jamais se viu em nenhum São João. Os "sem" responderiam com foices, com pedras... e se abrigariam no cerrado, na caatinga, na mata atlântica inspirados nos vietnamitas. O Palácio do Planalto entregue aos sem-teto, que se abrigavam até debaixo da rampa. Mas e o Lula?
Lula estava atrás das grades, fora deposto num golpe que uniu a extrema esquerda e a extrema direita. Festa dos radicais. Após o golpe, Lula foi condenado imediatamente por um juiz que nunca se conformou com a Reforma da Previdência. Palocci, Genoino e vários ministros faziam-no companhia nas celas ao lado. Zé Dirceu estava foragido. Os mais esperançosos acreditavam em uma tacada mirabolante do Ministro da Casa Civil e os radicais pagavam uma "mega-sena acumulada" pelo seu paradeiro. O exército brasileiro não sabia o que fazer, afinal, não participara do golpe.
Fidel Castro (Cuba) e Hugo Chaves (Venezuela) tentaram enviar ajuda, mas foram impedidos pelas Nações Unidas. A ONU havia dado, mais uma vez, carta branca aos EUA. As bombas inteligentes achariam até o último "sem". As notícias da ?guerra? eram cercadas de propagandas da Coca-Cola e do McDonald's. O tio Sam temia que os "sem-terra/teto e companhia" invadissem o Central Park, em Nova Iorque, e se espalhassem pelo mundo como uma nuvem de gafanhotos famintos.
Grande parte dos parlamentares e dos intelectuais desejosos de revolução havia fugido para o exterior. O Congresso lotado de sem-terra. Na falta de um fim político para o movimento, eles se empolgaram com os tapetes verdes da Câmara dos Deputados e queriam plantar milho ali. Afinal, eles só queriam um lugarzinho para plantar o que comer. A obra de Niemayer ameaçada pelas bombas dos aliados (ou alguém se esqueceu da Inglaterra). Havia quem torcesse por uma contra-revolução liderada por Fernandinho Beira-Mar ou pelo Enéas.
A TV "plim-plim" preparava suas câmeras exclusivas e seus globais para a transmissão ao vivo do confronto mais importante: a possível tomada da Praça dos Três Poderes pelas tropas americanas. Recorde absoluto de audiência. Ninguém pensava mais em novela das oito, campeonato brasileiro... o desespero tomava conta e apelar para quem? Xuxa? Ronaldinho? Padre Marcelo? Não... eles não poderiam fazer nada... O jeito era pensar mais alto: Homem-Aranha, Indiana Jones, Rambo... não, estes são todos produtos norte-americanos.
No final da guerra, milhões de "sem" estariam mortos, Stedile desaparecido, os radicais, políticos ou não, ainda vivos, seriam presos, e tudo voltaria ao normal. Com a morte desses "sem" e de milhares de inocentes, diminuiria o número de pobres/miseráveis. O país teria um crescimento ímpar, já que a construção civil reconstruiria "fisicamente" o Brasil. E os soldados aliados montariam bases na Amazônia, com a desculpa de que Stedile, Bin Laden e Sadam se esconderam ali. E a presidência seria entregue para....
- Nãããããããããoooooo!!!!!!!!!! 3h30 da madrugada: banho frio e gotas de dipirona.
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