04/01/2012 - Pranto de macaúba
Lá no fim da estrada tem um pé de macaúba, uma toca de coelho e a casa de uma viúva que fez votos com o silêncio. Lá, o mato passa da linha da cintura, o canário canta estalado, a lua parece um queijo do sertão. Lá pros fundos da mata corre um riacho com peixe bom. Tem história de curupira e de martim pescador. Quando chega o inverno, a geada cobre o campo numa invernada de trincar os ossos. A cadeira de balanço da varanda balança entre passado e futuro. Volta e meia do fogão a lenha da senhorinha sai um tabuleiro de bolo de fubá, uma caçarola de feijão e uma bacia de torresmo.
Quando maduros, os macaúbas cheiram longe. Um perfume doce que chega a melar na boca. Por debaixo daquela casca dura, uma semente de açúcar. Os cipós trançam na cerca e chegam a dar flor. Flores que se penduram nas ramas bordadas pela velhinha que vai perdendo os olhos para a catarata. A chuva cai mansa devolvendo cor à paisagem. Enquanto o cachorro mateiro se embrenha no brejo atrás dos coelhos, o gato ruivo se espicha na janela. Encostada na soleira da porta, a viola do velho descansa. Vez ou outra, o vento tira som de uma ou duas das sete cordas, arrancando dos olhos da viúva lágrimas de macaúba.
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