10/10/2009 - Perpetuum mobile
Eu queria não correr, encontrar um jeito de viver mais devagar. O mundo passa por mim e eu sou obrigado a segui-lo mesmo querendo ficar um minuto A mais. E é por isso que amo intensamente, amando demais. O mundo se alimenta de mim: dos meus sonhos, das minhas fantasias. E eu vou assim, feito cegonha e querubim, morrendo com as noites, renascendo com os dias. O que era para ser prazer tornou-se uma agonia, uma ebulição delirante. E é preciso ser cada vez mais constante num mundo inconstante, volúvel, volátil. Viver a correr é sobreviver e sobreviver não é fácil. Se ao menos existisse um jeito de viver em slow motion. Mas a vida não é feita no escurinho do cinema. A vida é um poema sangrando. A vida é um coração latejando, um moto-contínuo. Um desatino completo, o encontro do velho e do feto num tempo nem sempre predileto. Dentre tantas idas e vindas de pensamentos e sentimentos, a vida é um movimento perpétuo.
Eu queria não correr, encontrar um jeito de viver mais devagar. Mas os quadros da paisagem que me cerca vão se sobrepondo com mais e mais intensidade. O trem do tempo vai passando e eu vou me perdendo nos trilhos da saudade. Sinto falta de um tempero, de uma cor, de um viveiro, de um calor, do que não vejo, de um desejo, de um caminho, de uma flor, de um espinho, de uma rua, de um papel e de uma lua que ficou num outro céu, numa outra escuridão. E eu me procuro no sótão, me esconjuro no porão e me seguro no portão. Mas o vento da vida é mais forte, a correnteza do tempo me leva pro norte. Eu não sei o que é o norte, só sei que é mais próximo da morte. E será que depois do eclipse total, do apocalipse visceral, existirá um novo Adão, nascerá uma nova Eva? Será que depois de tanta correria, tanta treva-agonia, eu descansarei na relva do Éden? E agora, será que contrario o ritmo, invento um novo logaritmo de tempo ou faço o que me pedem? O quem me pedem? O que me pedem!
Eu lamento, mas o que me pedem é o perpétuo movimento, perpetuum mobile, perpetuum mobile, perpetuum mobile...
Comentários
Nenhum comentário.
Escreva um comentário
Participe de um diálogo comigo e com outros leitores. Não faça comentários que não tenham relação com este texto ou que contenha conteúdo calunioso, difamatório, injurioso, racista, de incitação à violência ou a qualquer ilegalidade. Eu me resguardo no direito de remover comentários que não respeitem isto.
Agradeço sua participação e colaboração.