Daniel Campos

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07/03/2008 - Paz verdadeira

Ao saber que o presidente da Venezuela, Hugo Chavéz, está em busca da paz verdadeira fiquei preocupado: será que já começou a época dos paturis? Lembro de ser percorrido pelo vento, em silêncio, na varanda das árvores. Há uma diferença entre casa na árvore e árvore na casa. O meu caso é o segundo! São dezenas de joão bolão, pau-d´alho, imbaúba, amoreira, castanheira, ameixeira amarela... E eu ali, no meio daquele verde com os olhos divididos entre o céu e o lago...

Fico entregue a um movimento constante. Cabe destacar que a vida é a arte do ir e vir. Bandos e mais bandos de paturi pousam no lago e ficam por ali a deslizar. Pés de todos os tamanhos vão se movendo em fila indiana, criando trilhos azulados e provocando pequeninas ondas que se quebram contra o barranco, que abriga os ninhos das tilápias. São aves pequenas, de penugem escura, que mergulham a cabeça na água em busca de alimento. Fico horas observando-as.

Depois de muitos anos, recordo-me de Comandante, um paturi recém-nascido, cor de fuligem, que foi abandonado pelo bando. Levei-o para casa e ele ficou sobre cuidados especiais em uma gaiola improvisada. Ganhou cobertores e mingau no bico, mas o que ele gostava mesmo era de andar sem destino. Vivia se escondendo debaixo das camas, dos armários, da máquina de lavar roupa. Mas o instinto primitivo não permitiu que ele durasse muito tempo lá em casa. De certo modo, partiu junto com seu grupo.

Uma angústia me aperta o peito. E se como Comandante, os outros também partiram sem avisos? Afinal, com a ameaça do fim do verão, eles migram para lugares mais quentes e atrativos. Tento me concentrar, mas não vejo aquele balé de pássaros que contagia a minha vista e me faz sonhar alto. Não sei por que me lembrei desses paturis, mas talvez o conceito de paz verdadeira passe por eles.


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