Daniel Campos

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03/04/2011 - Passos de alfazema

Em algum lugar da minha memória genética, real, hipotética, carnal, física, imaterial, afetiva ou proibitiva, a cidade me amanheceu cheirando à alfazema. Entre o dilema dos romances, o desbotado das fotos e o desenrolar dos filmes, das matas às ruas baratas a cidade se perfumou. E a fragrância durou o tempo, breve e necessário, de uma mulher passar pelo perímetro dos meus olhos. Passou como quem não quer nada e quer tudo ao mesmo tempo. Passou como passa o vento, dobrando árvores, arrastando emoções, ouvindo apelos, embaralhando letras e ouriçando os cabelos. Passou deixando tortas as sarjetas que se jogaram aos seus tornozelos.

Passou desfiando a linha bamba do meu destino. Passou mexendo em minha memória. Passou e pairou no ar como pairam os beija-flores. Passou e subiu até o vigésimo nono andar da minha imaginação para depois me levar ao meu porão lotado de desejos. Passou trazendo com ela uma lua imensa que queimava como parafina em noite de núpcias. Passou causando burburinho, revolução e até mesmo uma canção inédita, que escapulia de seus lábios. Passou como que se divertindo e pedindo bis. Passou pisando ora nas notas de um piano ora nas teclas de uma máquina de escrever.

Ambos, o piano e a máquina de escrever, moram em mim. Já Marilene, a mulher, somente passa, perfumando de alfazema a cidade, levando-me em poema para as masmorras da saudade.


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