21/09/2010 - O segredo dos relógios
É o relógio pulsando no pulso de quem volteia pra lá e pra cá como ponteiros que se encontram e desencontram a cada volta. É o relógio de parede nos observando dos cabelos aos sapatos. É o relógio de bolso nos acorrentando ao que vai ficando. É o relógio digital mudando as horas como se fosse mágico. É o relógio no visor do celular, no canto da tela do computador, piscando no painel do carro. É o relógio no forno microondas, nos jornais da televisão, nas fachadas dos prédios, na torre das igrejas. É o relógio sendo cultuado como objeto de apreensão nos saguões do aeroporto, da rodoviária, das estações do trem. É o relógio de areia, de sol, de corda, de lítio. É o relógio marcando o tempo da vida, anunciando o início das refeições sobre a mesa, o horário de acordar, sonhar e dormir, o banho, o momento da chegada e da partida. É o relógio tiquetaqueando pela nossa cabeça dizendo que está na hora de ir, de vir, de fazer, de comer, de saber, de querer...
Quando o assunto é relógio, duas imagens ganham destaque em minha cabeça. A primeira delas é a de meu avô Antônio, na mesa da sala de jantar, desmontando, ajustando, limpando sua coleção. Detrás das lentes sisudas dos óculos de grau, passava horas em silêncio numa paciência milimétrica cuidando daqueles relógios antigos. A outra cena é a de meu avô Liberato equilibrando-se em uma cadeira na sala de televisão para dar corda e ajustar as batidas de um relógio de pêndulo que um dia fora de seu pai. Curiosamente, esses dois homens jamais se deixaram dominar pelo tempo. Ambos viveram ritmos próprios ao longo de suas passagens pela Terra. Na verdade, os relógios é que sempre precisaram se adaptar a eles. Talvez esteja aí o grande segredo da vida: o tempo não é uma coisa que está fora, mas dentro de cada um de nós.
Definitivamente, ainda tenho muito a aprender com esses dois homens de carne e osso que souberam, sempre que necessário, dar um pouco mais de corda ao tempo.
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