18/06/2008 - O samba e o choro
"Chegou ô, ô, ô, ô
A Mangueira chegou, ô, "...
No último sábado, morreu Jamelão. Não estranhe, caro leitor, ao pensar que meu texto está atrasado. Acreditei que minha homenagem póstuma, a esse sambista morto, ficaria melhor em uma quarta-feira, dia em que o carnaval finda sua alegria... Não é semana santa, mas hoje a quarta-feira é de cinzas. Cinzas de lembrança repicada. Cinzas de dor cadenciada. Cinzas de uma tristeza sincopada. Morreu o samba. Ou melhor, morreu a voz do samba.
E não é que o mau-humor mais querido do samba morreu bem no dia da tradicional feijoada de sábado do morro da Mangueira. Só mesmo um bamba como ele para uma coisa dessas, e mais: unir em um mesmo cordão samba e choro. Samba nas vozes rosa. Choro nos olhos verdes. A morte de Jamelão deixou a nossa verde-rosa pálida. Muito bonito, não é seu José Bispo Clementino dos Santos?
Jamelão é tão diferente de tudo que seu enterro deixou o silencio e o pudor de lado para ser regado a muita música e cerveja. Beth Carvalho, Carlinhos de Jesus, Alcione, Antônio Pitanga e outros famosos se uniram ao pranto dos anônimos da Mangueira. Chico Buarque, tema de um dos enredos campeões na voz de Jamelão, chorou de Paris. Tom Jobim, outro mangueirense de raiz, abriu o piano para esperar o mestre lá no andar de cima.
Quando o caixão saiu da quadra da escola, como uma alegoria, foi aplaudido por um coro de dar inveja a qualquer escola em dia de Marques de Sapucaí. A bateria nota dez da Estação Primeira fez o coração do inverno bater mais forte. O carro alegórico deu lugar ao carro do Corpo de Bombeiros e, por brincadeira do destino, Jamelão passou pela última vez no Sambódromo. Mais aplausos. Quando o "desfile" chegou ao cemitério, o choro da mulher com quem viveu os últimos 58 anos já era um samba triste cantado por todo o Brasil.
"A Mangueira não morreu nem morrerá
Isso não acontecerá
Tem seu nome na história
Mangueira tu és um cenário coberto de glória"
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