Daniel Campos

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22/07/2008 - O exercício de esquecer

Ai de nós se não houvesse o esquecimento. Nosso corpo não suportaria tanto peso. Nossa mente não suportaria tantas gavetas. Nossa alma não suportaria tantas amarras. É preciso ter uma corda de descarga para mandar o inútil para uma espécie de lixeira. Ah! Ainda bem que existe essa dimensão chamada esquecimento para abarrotar lá as repetições sem graça do cotidiano e essa futilidade toda que nos cerca. Afinal, não podemos armazenar em definitivo o escândalo de um banqueiro, a barriga de um jogador de futebol, o discurso de um político, a fama de um participante de reality show... Por si só, eles são efêmeros.

A vida a ser vivida em carne viva deve ser outra. Ou melhor, a nossa. A roupa de fulano, o casamento de cicrano, o vai-e-vem de beltrano não me interessa. E a mídia insiste em fazer disso a nossa prioridade. Independentemente se anônimo ou famoso, o supérfluo nos cerca, nos sufoca, nos castiga, nos reprime, nos tortura... Ah! Ainda bem que existe o esquecimento. Lá podemos amontoar esse monte de inutilidades numa espécie de arquivo morto. Se não podemos esquecer nossas dores e preocupações, ao menos é permitido nos desvencilhar de parte de um mundo que não nos interessa.

Dou graças por não ter memória de elefante. Lembro-me por muito pouco tempo do que não faz meu coração bater mais forte. Ao longo dos anos, adquiri o exercício do esquecer. Fatos sem importância ou rostos não-gratos desaparecem da minha memória para sempre com uma facilidade extrema. Ah! Como é bom se esquecer de seres humanos que não valem a pena, dos pormenores do dia-a-dia que não contribuem para minha felicidade e da realidade desprezível que tenta me fazer desprezível também. Ah! O esquecimento é maravilhoso.


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