Daniel Campos

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18/08/2012 - O clareio da passarada

O galo cantou para o céu que Santa Clara clareou. E o cocoricó puxou, como maria-fumaça, vagões e mais vagões de pintassilgos, canários, cotovias, patativas, periquitos. A cantoria se espalhou feito semente no vendaval. O dia ainda engatinhava e já tinha pé de tudo o que é canção brotando para lá e para cá. O lavrador, de chapéu de palha e enxada nas costas, passou assoviando um assovio com gosto de café. E, por alguns instantes, mesmo com os pés enraizados naquela terra de gerações, pensou ter asas.

Naquele inverno sem nuvens, céu azul era um convite aos mergulhos do azulão. Até a lua, já quase invisível, arriscou um ária. O bem-te-vi guardava um pouco daquele sol em seu peito amarelo. E a coruja, no escuro de um buraco, escondia seus olhos da claridade do mundo. O pardal ia aos pulos, o joão de barro em barro e o sabiá, com seu coração vagabundo, ia se aninhando no fundo de uma saudade. A menina, no auge de sua meninice, dançava no meio do terreiro ao som da passarada.

O violeiro da janela tentava tirar outros pássaros das cordas de sua viola. O curió, a emília, dona benta e o marques de rabicó. Era tanto pica-pau amarelo, vermelho e azul. Pássaros em bolero, em valsa, em blues num passo caipira. Os quitutes da sinhazinha assanhavam o sanhaço. A viuvinha e o cardeal num amor proibido entre as folhas da paineira. O rouxinol afinado no apito da chaleira. E o pássaro-preto era o que restava da cor da noite naquele dia que o galo cantou e Santa Clara clareou.


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