Daniel Campos

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12/05/2011 - Noites de coquetel

Petiscos de nomes complicados acomodados em pratarias, bebidas oferecidas em copos de uma geometria suntuosa, garçons bailando pelo salão em traje de gala. O propósito de um coquetel não é alimentar, mas impressionar. Alimentar, na verdade, alimenta o ego, a inveja, a luxúria e tantos outros sentimentos menores. O que, na teoria, seria um espaço de confraternização torna-se um local de reparação. Repara-se na decoração, nas vestes, nas maquiagens, nas falas, nos passos, nos gestos e até nas ausências.

Tudo é cheio de cerimônia, de burocracias, de uma aristocracia que já não existe. As conversas são direcionadas, propositadas, forçadas. Qualquer cumprimento já vem agregado a segundas intenções. E dá-lhe pose para fotos. Sorrisos amarelos, abraços rasos, promessas condenadas a morrer nos próximos segundos. Pode-se dizer que cada um carrega uma ou mais máscaras sobre a face. Olhos cínicos e risos mímicos. Nada é natural, tudo é forjado no artificial. Cortes de realidade, cidade em redoma.

Troca de telefones, de emails, de endereços como se fosse possível construir relações duradouras num coquetel. Ao saírem pela porta, todos se tornam estranhos, levando cada qual um leque de pretensões egoístas. Elogios rasgados para lá, necessidade de aplausos para cá. Currículos declamados como um poema heróico. Personagens de uma história sem pé nem cabeça andando em círculos. Tudo é calculado, da hora da chegada até ao instante da partida. Uma encenação onde até as emoções são pré-fabricadas.

Por essas e outras, em noites de coquetel, acabo sempre num carrinho de cachorro-quente.


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