Daniel Campos

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14/04/2011 - No alto do alto

No alto da torre, a mulher avança pelo horizonte como capitã de um imenso navio, que enfrenta as ondas do mar com a mesma desenvoltura que escorrega pelo rio. Ali, no alto do alto, ela se põe a observar a vida e, até mesmo, a morte. Esparrama seus olhos por aquele oceano de gente e de construções com a segurança de quem está atrás de uma janela de cobertura. Mesmo que de forma abstrata, domina a região e seus movimentos. Chega a fingir para si própria que conhece o que pensa e sente sua tripulação.

Dali, do alto de seu sapato alto, ela se deixa levar pela palpitação da lua, pelo conflito entre astros e estrelas, pelas moças em flor que caminham pelo universo. Capitaneia o acender e o apagar das luzes, as voltas que a terra dá, o clima da serra e as revoadas do sabiá. Ela se embriaga com algumas garrafas de infinito e tropeça nos olhos apaixonados que lá de baixo a cortejam. Novamente finge que esses olhares não existem tomando a solidão como aposento. Sente-se rainha e confraterniza com o silêncio.

Capitã dos ares, ela se debruça sobre os amplos espaços que cercam sua nau e se preenche de um estranho contentamento – de que não precisa de mais nada senão navegar por corpos e almas alheias. No alto da torre ela é soberana, como aranha no centro da teia, como beleza nos olhos da feia, como lua cheia na escuridão. No alto do fato, do pacto, do abstrato, ela avança e dança e trança palavras e pausas num tecido fino que cobre o mundo como sereno de destino.


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