29/05/2015 - Na sua cama
Quando eu tive medo corri para debaixo das suas asas de mulher-pássaro meio águia meio colibri. Porém, você tinha voado e eu não vi. Escondi-me na sua cama, por entre suas cobertas ainda cheirando ao seu corpo de sândalo e patchouli como se ninguém fosse jamais me encontrar naquelas nuvens de perfume, contornos e lã. Não havia qualquer motivo para desconfiar de quem quer que chegasse, pois quem ousasse entrar saberia que do seu amor não poderia mais provar. Eu continuei seguro mesmo no escuro de tantos acontecimentos. E então eu ouvi do vento, de um pedaço de vento que entrou pela veneziana, que você mesmo longe estava feliz de me saber na sua cama. E eu me enterrei em seus lençóis como se cavasse fundo e mais fundo nas molas de suas costelas. E eu rasguei os travesseiros em busca das preocupações ou divagações que escorriam dos seus ouvidos. E eu ouvi sem querer e sem poder cada um dos seus últimos gemidos. E foi instantâneo ter ciúme e prazer numa rima barata de amor e dor. Eu que havia fechado as cortinas para não ser visto fui quisto por cada uma das suas meninas. Cada dia que avança deixa uma menina para trás. E tanto tempo faz que nossos dias se cruzaram num sol lilás. E agora o mesmo tempo que nos aproximava, que nos ligava, que nos versava, abocanha-nos de forma voraz como se de toda ferocidade fosse capaz. Por isso, antes de ser totalmente tomado, devorado, amaldiçoado pelo tempo, corro para sua cama sem querer me perder ou morrer sem ter vivido o que me ama.
Comentários
Nenhum comentário.
Escreva um comentário
Participe de um diálogo comigo e com outros leitores. Não faça comentários que não tenham relação com este texto ou que contenha conteúdo calunioso, difamatório, injurioso, racista, de incitação à violência ou a qualquer ilegalidade. Eu me resguardo no direito de remover comentários que não respeitem isto.
Agradeço sua participação e colaboração.