04/04/2010 - Hoje é Páscoa
Hoje é Páscoa. Dê um sorriso. Abra os braços. Cante uma canção. Vá além da mesmice e faça ou pense ou coma ou beba algo diferente. Busque um novo eu por entre o corpo e a alma. Sonhe acordado. Esqueça a dor. Traga o céu mais pra perto. Beije. Deseje. Comemore. Tome coragem e vire personagem principal do seu filme. Hoje é Páscoa. Hoje é a passagem de um tempo. Sinta o ar e agradeça aos bons ares. Voe. Acredite ao menos em uma boa-nova e vá em frente. Aliás, siga sempre em frente. Converse com as flores. Acenda uma estrela. Tire alguém para dançar. Que tal se namorar um pouco? Anexe coisas boas aos pensamentos. Faça bater mais forte um coração. Respire, inspire e vire-se em mil: hoje é Páscoa. Um dia poderoso tanto bíblica quanto poeticamente.
Pascoalmente falando, hoje tudo é permitido. Está dito e pronto para ser lido mais uma vez: Jesus ressuscitou dentre os mortos. Então, pense bem: o que você quer ressuscitar em você? Pode ser um momento, um verso, um cheiro... que tal voltar a viver como um todo ou plenamente? Hoje é Páscoa. Lambuze-se de chocolate. Mas caso não se satisfaça só com os ovos recheados de bombons, procure outro sentido para sua Páscoa. Debaixo da cama, dentro das gavetas, no espelho, no fundo de um livro, no meio da rua... Em algum lugar de hoje deve haver uma Páscoa esperando ansiosamente por você. Chegou à hora de enfrentá-la, de degustá-la, de encará-la, de dominá-la, de saciá-la, de amá-la, de concretizá-la... Aliás, fica ao seu critério como se dará esse encontro pascoal.
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Findado este primeiro texto, posto outro, mais pessoal e não menos inspirador, sobre o dia de hoje:
Páscoa com Líbio e Adélia
Hoje, ao primeiro minuto de Páscoa, corri para o quintal. Mas Pituca e Leleco, o casal de coelhos que comprei no fim do ano passado, não me entregou ovo de chocolate algum. Depois de tanto roerem paredes, caixas de papelão, vassouras e outros objetos domésticos eles não produziram o tão afamado produto da Páscoa. Se bem que aqueles coelhos me lembraram outro casal, bem menos orelhudo e não menos sapeco e poético.
Páscoa, para mim, sempre foi sinônimo de fartura. Fartura de alegria, de comidas, de fé. Muito dessa compreensão foi culpa de meus avós, Líbio e Adélia. Hoje, tempos atrás, eu acordava de madrugada com os fogos e sinos alardeados pelas igrejinhas da região. O desjejum era feito com um gole de café preto. O corpo ganhava casacos. Sob a companhia das estrelas, descia a rua São Pedro de braço dado com Adélia, uma senhora de jeito tímido e olhos brilhosos como os de uma criança na frente de uma panela de brigadeiro.
Ao longo da caminhada encontrávamos outros vizinhos e conhecidos. Ao contrário do bom-dia costumeiro, o "Feliz Páscoa" ecoava como uma máxima por aqueles ares de outono. Era um sentimento contagiante. E ao chegarmos às proximidades do Teatro de Arena, sob árvores e estrelas, assistíamos com lágrimas nos olhos o encontro de duas procissões que vinham com velas e cânticos de lados opostos. No teatro, os fiéis se misturavam e uma salva de rojões anunciava o encontro de Maria com Jesus ressuscitado.
Frei Alcides e frei Afonso e outros religiosos da Paróquia de São Benedito vestiam branco. O roxo utilizado durante toda a quaresma saia de cena. E naquele cenário, de galos cantando, de grama orvalhada e do dia começando a amanhecer, era que se dava a celebração de Páscoa. Dona Adélia não largava meu braço. Talvez tivesse medo de ser engolida pela multidão ou daquele menino que ela ia buscar numa escolinha chamada Caracol sumir de suas vistas cansadas.
Findada a missa, era a deixa que seu Líbio precisava para colocar em prática seu entusiasmo. Para meu avô, Páscoa era festa. Dia de ir ao sítio, fazer churrasco, comer carne de porco, brindar o novo tempo, dançar modas sertanejas, contar causos. Ele ria, abria os braços, cantava. Era o dono daquela festa que unia a família em torno de uma celebração. Se Jesus resolvesse voltar e quisesse ser realmente bem recebido tinha de bater naquele sítio. Com meu avô como anfitrião, o salvador estaria em boas mãos.
Foi dessa forma que passei a maioria de minhas Páscoas. Foi dessa forma que aprendi a unir religiosidade e festa. Foi dessa forma que guardei, numa espécie de baú da memória, muitas histórias para contar. Como se esquecer dos abraços apertados de seu Líbio desejando Feliz Páscoa? Como não se lembrar dos olhos felizes de dona Adélia diante de um ovo de chocolate? Eles se foram, mas a Páscoa vivida por eles ficou impregnada em mim.
E, de certa forma, aquele casal de coelhos entendeu isso. Afinal, aquelas pelúcias vivas souberam que o tão cobiçado ovo de chocolate não me era necessário. Necessário mesmo era a doçura do amor que unia dois pedaços de vida em torno de um mundo novo. E esse tipo de amor era abundante naquele casal, no mínimo, inspirador.
Observação do autor: Feliz Páscoa!
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