Daniel Campos

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Grávida

Grávida, ela teria o andar equilibrista de sempre. Grávida, ela caminharia um pouco mais devagar. Grávida, existira o cuidado, o zelo, mas os saltos teriam a mesma altura. Grávida, ela traria os últimos botões desabotoados. Grávida, os cabelos viriam presos, não sei por qual razão, mas viriam presos. Grávida, ela passaria a conversar ainda mais consigo mesmo. Grávida, os sobressaltos seriam mais raros. Grávida, misturar-se-ia à barriga numa cena digna de filme europeu. Grávida, ela se pegaria lendo as mesmas páginas de um romance qualquer. Grávida, ela ficaria horas a fio, tentando adivinhar o sexo do bebê, a partir de seus movimentos, embora tivesse a resposta na ponta da língua. Grávida, encher-se-ia de segredos. Grávida, ela iria mergulhar ainda mais em si. Grávida, ela teria todos os motivos e justificativas para deixar escapar uma lágrima. Grávida, ela seria manhosa. Grávida, tantos sonhos seriam gerados com a criança. Grávida, ela procuraria um lugar para se esconder longe de qualquer civilização. Grávida, ela se fingiria carente. Grávida, ela acreditaria em fadas. Grávida, ela dançaria com a barriga, escondida de qualquer testemunha, uma música que há tempos não ouvia. Quem sabe Phill Colins. Grávida, a feminilidade lambuzaria os seus lábios. Grávida, seus sorrisos seriam ainda mais longos. Grávida, ela teria vontade de tantas coisas que não existem. Grávida, ela iria deixar ser tocada pelo sol. Grávida, ela pediria conselhos para a lua. Grávida, ela se tornaria mais arisca. Grávida, ela faria visitas a tantas portas que ela mesma havia trancado. Grávida, ela se sentiria mais forte. Grávida, as contrações não seriam maiores do que nenhuma outra dor. Grávida, o parto seria calmo, sem gritos ou gemidos. Grávida, o maior medo seria ver o bebê deixar o seu corpo. Grávida, agarraria a criança, como sempre tentou agarrar o mundo. No entanto, mesmo com unhas compridas, o bebê escaparia e deixaria a despedida em suas mãos. Grávida, ela se entregaria aos sonhos.


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