Daniel Campos

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15/11/2012 - Feliz Umbanda

"Chegou, chegou, chegou com Deus,
Chegou, chegou o Caboclo das Sete Encruzilhadas”

Com este ponto, saúdo o Caboclo das Sete Encruzilhadas, a entidade espiritual que fundou a Umbanda.

Foi essa entidade que no dia 15 de novembro de 1908, durante um culto espírita em Niterói, no Rio de Janeiro, se manifestou por meio do médium Zélio Fernandino de Mores para dar início a uma religião genuinamente brasileira.

Uma religião que respeita a memória ancestral de um país que deve muito do que é ao sangue, às crenças e ao suor do indígena e do negro.

Segundo palavras do próprio Caboclo das Sete Encruzilhadas, a Umbanda nasceu para os espíritos dos negros e índios poderem dar a sua mensagem de igualdade entre os povos.

Uma religião sem luxos ou vaidades, para falar aos humildes.

Em uma de suas traduções, Umbanda quer dizer “Deus ao nosso lado”.

Depois de séculos de sofrimento, de negação, de exclusão, a essência da nova religião pregava um Deus não só ao lado do branco, mas também do vermelho e do negro.

Por isso, neste dia 15 de novembro, todos nós, umbandistas ou não, precisamos celebrar. Pois trata de uma data em alusão ao nascimento de uma religião voltada para os excluídos que são tão parte deste país quão qualquer brasileiro.

A Umbanda nasceu depois da Lei Áurea, mas em uma época onde não havia liberdade religiosa. Época em que os cultos africanos eram caso de polícia. Todas as religiões que tinham alguma semelhança com rituais africanos eram perseguidas, os terreiros destruídos e os praticantes presos.

Porém, logo em sua primeira manifestação, Caboclo das Sete Encruzilhadas disse que não haveria caminhos fechados para ele. Sendo assim, por mais que a Umbanda fosse perseguida, conseguiu se sair e seguir sua estrada.

Ao longo dos tempos, além do candomblé e de outras religiões de matrizes africanas, a Umbanda absorveu elementos do catolicismo, do espiritismo e da religiosidade indígena. A religião que cresceu e se diversificou é hoje tão plural quão a alma brasileira.

Além da Umbanda original, chamada de Umbanda Tradicional, há a Umbanda dos Sete Raios, a Umbanda Kardecista, a Umbandomblé, a Umbanda de Angola, a Umbanda Traçada, a Umbanda Esotérica, a Umbanda Eclética Maior, a Umbanda Iniciática, a Umbanda Sagrada, a Umbanda Guaracyana, a Umbanda Popular ou Cruzada.

A beleza da Umbanda está no fato da religião não ter uma cartilha, um livro sagrado, um modelo padrão. Cada casa vem com seu lema, com seus rituais, com seus guias e mentores, com sua maneira de louvar, com suas entidades, mas dentro da verdade e da fé que é a Umbanda…

Depois de cumprir sua missão de criar os primeiros sete templos que seriam responsáveis por divulgar a Umbanada, Caboclo das Sete Encruzilhadas trabalhou pela organização da nova religião. Após o falecimento do médium Zélio Fernandino, na década de 1970, a entidade não mais se manifesta nos terreiros, mas continua incumbida de zelar pela religião.

Uma religião que, por inspiração da Nação Nagô, tem como fonte criadora universal, um Deus supremo, chamado Zambi.

Aximane Ngana Zambi!

As minhas homenagens aos pais e mães de santo, às mães-pequenas, aos sacerdotes e sacerdotisas, aos ogãs curimbeiros e ogãs atabaqueiros, aos filhos de santo e a todos os praticantes desta religião... Pessoas que são exemplo no barracão e na sociedade.

Um saravá a todos os preto-velhos, caboclos, crianças, boiadeiros, marinheiros, baianos, orientais, mineiros, malandros, ciganos, exus e pombas-giras que movimentam essa religião vivida no templo, no centro, na tenda, no terreiro...

A minha saudação aos falangeiros, que são os mensageiros de orixás como Oxóssi, Iemanjá, Oxalá, e de tantos outros que dão vida, luz e sentido a nossa vida.
Para citar apenas alguns dos falangeiros mais conhecidos nesta religião, de modo a homenagear a todos, dou salvas aos caboclos Beira-Mar, Iara, Rompe-mato, Sete Flechas, Vira-Mundo, Jurema, Guaracy, Tupi, Sete Pedreiras, Sete Cachoeiras, Sete Montanhas...

O meu respeito a todas as entidades que trabalham para ajudar os encarnados com conselhos, curas, descarregos...

Que neste 15 de novembro, celebrando o Dia Nacional da Umbanda, instituído pela presidenta Dilma Rousseff por meio da Lei 12.644, de 16 de maio último, possamos viver em um país que ninguém seja perseguido por sua crença, sofra qualquer preconceito por sua prática religiosa ou tenha vergonha em dizer: “Eu sou umbandista”.

Que possamos reconhecer a Umbanda como parte da nossa raiz.

Umbanda é o Orixá que é a simplicidade, a pureza e a força da natureza.

Umbanda é aquele que se dá ao Orixá para depois transmitir aos outros essa energia em forma de auxílio espiritual. É o médium que se entrega aos seus guias para cumprir uma missão maior, para integrar um trabalho histórico e coletivo.

Umbanda é colocar suas guias para fazer o bem, o bem-comum. É viver sua religião sem querer nada em troca. É vestir branco sem vaidade; é bater cabeça ao seu orixá em sinal de humildade.

Ser Umbandista é não ter vergonha de levar sua oferenda para uma praia, para uma mata, para uma cachoeira, para uma pedreira, para uma encruzilhada.

É estar sempre pronto a atender ao chamado da sua religião, seja no terreiro, na encruza, na calunga, enfim, seja onde for que o trabalho tenha de ser realizado.

Ser Umbandista é se alimentar do som e do ritmo dos atabaques, das macumbas e dos tambores.

A minha alegria aqueles que, a partir da vibração sentida dentro de uma gira, transformam-se em pessoas melhores.

O meu respeito ao transe, à incorporação, aos passes, às danças, aos cânticos, às bebidas e às comidas que são parte do sagrado.

O meu respeito aos aprendizados, experiências e corações existentes na Umbanda.

A minha reverência ao compromisso, ao comprometimento, ao amor e a seriedade daqueles que abraçam a Umbanda.

O meu encanto com a pureza da reza, com a beleza dos ritos, com a realidade dos dias de trabalho dentro da religião.

Os meus parabéns aqueles que se enchem de alegria ao recebem seu Axé.

Os meus parabéns aos umbandistas, de fato, que vão além das palavras, e fazem, pensam e sentem o mundo como umbandistas.

Os meus parabéns aqueles que sabem que para a Umbanda não interessa cor, raça, classe social, tampouco opção sexual, religiosa, politica...

O que interessa é o respeito, o amor e a fé dentro do local onde se reza, se pede, se chora, se ajoelha, se canta, se agradece.

Os meus parabéns para aqueles que fazem da Umbanda uma religião de ajuda, de união, de caridade, de luta, de justiça, de cura, de realização, de choro e de contentamento.

Os meus parabéns aqueles que se dedicam a construir uma Umbanda livre, pronta para servir a todos que a procuram.

Que neste dia 15, saibamos aprender com as diferenças ao invés de criticarmos ou dizer que isso ou aquilo está errado na religião alheia.

Quero trazer a este Plenário uma máxima sempre repetida dentro da Umbanda: "Dê de graça, o que de graça recebestes: com amor, humildade, caridade e fé".

Que Zambi abençoe a todos e nos ajude a encontrar a receita do respeito mútuo.

Observação do autor: Pronunciamento proferido pelo senador Eduardo Suplicy (PT/SP) no dia 13 de novembro, no Plenário do Senado Federal.


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