Daniel Campos

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Eu prometo

Há quem prometa a lua e nem mesmo alcança as estrelas. Há quem prometa tomar jeito e continua igual ou até pior. Há quem prometa o céu e nem acredita em Deus. Há quem prometa voltar e nunca mais volta, sequer para dar uma desculpa. Há quem prometa parar de fazer promessas e nem desconfia de que a vida não existe ou, ao menos, não tem graça, se vivida sem promessas.

A promessa pode se dar aos murmúrios ou até mesmo na frente das câmeras de televisão. Promessas nascem em todo lugar. Algumas são ensaiadas, outras de improviso. O ato de prometer não é exclusivo de um ou de outro, todos prometem, cada um a sua maneira. Todavia, é preciso mais do que sorte para fazer a promessa parecer irresistível.

Antigamente faziam promessas e para dar credibilidade a elas, honravam palavras. E se não fossem cumpridas, por uma razão ou outra, a vergonha era tanta que o feitor da promessa ficava tempos sem sair de casa. Hoje, a promessa se banalizou. Algumas são feitas para nunca serem cumpridas. Nem por isso quem as faz deixa de sair às ruas e, o pior, de prometer novamente. Se não forem cumpridas, a culpa não é de quem as fez e sim do tempo, do espaço, do destino, enfim, dessas coisas que a ciência não explica.

O assassino que promete não matar mais, quando menos se espera, dispara a arma. O ladrão que promete não roubar mais, quando menos se espera, está escondido. O bêbado que promete não beber mais depois do porre, quando menos se espera, está caído na sarjeta. E tudo isso porque sabem que aconteça o que acontecer vai ter sempre alguém para acreditar nas suas promessas. Uma legião de políticos faz e refaz isso há tempos.

O tempo passou e a promessa evoluiu, modernizou-se. Ocorreu a industrialização da promessa, principalmente nos campos religioso e político. Vamos ficar com o segundo. A promessa se tornou um artigo a ser consumido. Aliás, um mercado lucrativo. Por detrás da promessa há um mundo à parte. Há uma equipe, que engloba todo tipo de gente (desde o mais frio ao mais alucinado dos humanos), encarregada em criar promessas. Há matemáticos que calculam as chances de uma promessa emplacar. Há maquiladores que dão uma carinha mais bonita para a promessa. Há aqueles que cuidam de espalhar a promessa. Muitas vezes, quem promete é só um corpo. Um corpo não menos transformado.

Hoje não basta prometer por prometer. No passado, falava-se: "eu prometo emprego", entretanto, agora, não é o suficiente. É preciso mais. È fundamental estruturar a dissecar a promessa diante do eleitorado. Não basta prometer emprego, é necessário falar das taxas de juros, dos índices de inflação, da estabilidade do mercado, da flutuação do dólar, da frente fria que vem da Argentina, do humor do Bush, FMI e CIA,... E dá-lhe dados, pesquisas, estimativas, gráficos, exemplos, comparações etc. Depois de toda explicação, você, hipnotizado, torna-se o maior devoto daquela promessa e a defende pelos quatro cantos.

Com isso, a promessa industrial perde a graça. Chega a parecer tão real, tão palpável, tão possível, que perde o caráter de promessa. É muito fácil acreditar nessas promessas, visto que as falhas (aquelas que nos acordam e permitem a nossa fuga) são cada vez menores. Criou-se um mercado de promessas. Foi-se o tempo em que as grandes promessas eram feitas em comícios. Comício parecia festa, tinha gente que não gostava de política, porém gostava de comício. Lembra-se dos comícios, leitor. Hoje, os políticos de ponta recebem tratamento de estrelas. O palanque agora é a TV. E lá estão eles, ensaiados e com um visual impecável, prontos para, quando for dado o sinal, dramatizar as promessas. Recentemente, os quatro candidatos à presidência da República foram vistos, em dias diferentes, na bancada do mais comentado telejornal brasileiro. Milhões de telespectadores assistindo dez minutos de promessas. Promessas no horário nobre e em rede nacional. Promessas: produtos à venda. Agora, se um anônimo qualquer quiser alguns segundos do mesmo programa televisivo para prometer a lua à namorada, amada, amante, esposa, seja lá o que for, ele nem conseguirá chegar perto das câmeras.

Por que seria menor o ato de um anônimo prometer a lua em relação ao ato de Ciro, Garotinho, Serra e Lula prometerem soluções políticas para o país? O curioso é que os candidatos tomam o rosto da promessa. Ciro Gomes, a promessa que trás consigo Brizola, ACM, Roseana Sarney, Fernando Collor. Anthony Garotinho, a promessa que se sustenta num populismo da pior espécie, o mesmo que deixou o Rio de Janeiro de ponta cabeça. José Serra, a promessa que nada mais é do que um genérico (piorado) de Fernando Henrique Cardoso. Luís Inácio Lula da Silva, a promessa que vai deixando a identidade pelo caminho em troca da cadeira de presidente.

Não é condenável acreditar em promessas. É bom se deixar levar por algumas promessas, isto é, quando se têm consciência de que promessas não são eternas. Mais importante do que saber esperar uma promessa, é saber esquecer uma promessa. Esquece-se uma promessa, sofre-se um pouco, aprende-se com ela e logo depois chegam outras promessas. Na indústria da promessa, a maioria das promessas são cópias das cópias das cópias. Diversos modelos à disposição dos candidatos, desde o clássico "promessa a Maluf" até o internacional "promessa a Bill Clinton". Infelizmente, sobram poucas promessas autênticas. É preciso cuidado para não sermos enganados pela mesma promessa.

Quando o candidato à presidência passar a presidente, as promessas terão um tempo para acontecer. Ou o candidato cumpre as promessas, isto é, parte delas, ou irá fazer outras promessas para ganhar tempo. Se cumprir suas primeiras promessas, tudo bem. Ao contrário, o ideal é a separação. Como naqueles casos em que se casa com promessas de amor eterno. Se a promessa não vingar e o amor se enfraquecer até deixar de existir, o melhor é se separar. Por isso, a promessa não vem com ponto final, há sempre um caminho de volta. Basta recordarmos uma das maiores promessas públicas já vistas: Fernando Collor.

Enquanto prometem acabar com a miséria, diminuir a concentração de renda, abaixar a taxa de juros, melhorar os salários, enfim, segurança, educação, saúde, moradia e coisas assim, alguns ainda, mesmo que esteja fora de moda, prometem a lua. E mesmo sendo alvo de tantos, ela, a lua, continua se equilibrando nas alturas da noite, com ares sedutores de promessa.


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