Eu e a roda-viva
Com todo o respeito e humildade necessários ouso professar: tem dias em que me sinto, tal Chico Buarque, "como quem partiu ou morreu". Dia em que me arrependo de amanhecer. Todos podem sorrir ao meu redor, mas acho isso tudo "um porre". Na cama, em casa, na rua, nenhum lugar me parece bom, uma angústia interior me percorre numa ânsia que me sufoca. Uma situação de incômodo me encurrala, não sei se o mundo me incomoda ou se eu incomodo o mundo.
As companhias pessoais ou materiais (os livros, os discos, os jornais,...) não me satisfazem. É uma sensação estranha de um desespero remoído, uma agonia que me obriga a fugir de tudo e de todos. Então, sem mais razões, encontro-me num canto, distante e solitário, onde eu posso me encontrar comigo mesmo, sem influências externas.
Então, e só então, a vida começa a fluir plena em minhas veias a ponto de conseguir me ver em meus olhos. As emoções armazenadas no porão do meu corpo são extravasadas numa roda viva de sentimentos. Calo, grito, choro... tudo de forma livre, abstrata, natural. È o instante em que mais me pareço humano. Estou livro e não sou condicionado a nada.
Um momento de reflexão, de pensar no que se passou, no que ainda resta entre o possível e o improvável e ponderar com o que está a ser feito. É como se eu "fechasse para balanço", tirando férias de mim mesmo. Esse refúgio pode durar alguns segundos, minutos, horas, mas atenção: nunca ultrapassa as barreiras de um dia. E tudo isso por quê? Porque o outro dia tem um novo sol, um novo tema, uma nova forma e, nesse cenário, a nobre esperança corre solta pronta a ser caçada como uma daquelas raposas vermelhas.
Nessa arrumação interior o que parecia certo pode vir a não ser. O caminho seguido pode ser modificado, traçado em outras linhas. Um tempo que fico propício para mudanças. Tempos que não sei se vou voltar e, caso decida fazê-lo, em que estado vou voltar.
Ao longo desse período de internação no mais profundo dos meus eus, olho para mim mesmo sem mesmo precisar de espelho. Olho-me e vivo-me sem pensar nas conseqüências. E sempre uma pergunta se repete. Valeu à pena? A vida como um todo até agora valeu a pena? Os feitos e desfeitos valeram à pena? Os sonhos valeram à pena? Eu vali à pena? Paro, silencio, extravaso os sentidos e os sentimentos e escuto lá no fundo de mim uma resposta em gonzaguinha: "começaria tudo outra vez, se preciso fosse"...
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