05/08/2011 - Esperança, minha meia-irmã
A esperança tem o meu sangue. No entanto, o parentesco não nos mantém unidos. Nossa relação é relapsa. Ficamos semanas sem nos falar. Ultimamente só nos encontramos em aniversários e enterros de outros parentes como o sonho, a angústia, a incerteza, o destino. Embora ela adore me dar de comer, eu ando enjoado de suas promessas. Já teve um tempo em que esperei muito por ela. Até que me cansei de esperar a esperança esperançar.
Já vivi com ela um incesto sem limites e sem pudores. Eu e a esperança, amantes tórridos, vivendo em um mesmo corpo. Tive uma paixão doentia por ela. Só que ela me traiu com o tempo, quebrou minhas expectativas e me envenenou com doses de depressão. Depois dela, nunca mais fui o mesmo. Antes, deveras apaixonado, eu via a esperança nos outros e nas coisas que eu fazia. Hoje, estou cego. Perdi a confiança na vida que está por vir.
Nunca consegui me perdoar por ter me deixado levar pelos caminhos da esperança. Tem quem diga que eu era uma pessoa melhor naquela época. Pudera, era um tolo que acreditava em tudo e em todos. Tinha esperança de felicidade, de viver melhor, de realizar o impossível... A esperança me deu uma força incomum. Voei alto e cai quando ela se foi, levando consigo as minhas asas. Foi um golpe duro, que me fez desesperançar.
Da minha relação com a esperança, engravidei e dei à luz o ceticismo.
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