Daniel Campos

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19/03/2008 - Confissões

Confesso que devia me confessar mais. Confesso que não gosto muito de confissões ou declarações orais. Prefiro as que coloco no papel. Por isso os meus poemas e a minha escrita, intensa e extensa. Minhas confissões são como estrelas, luz e escuridão. Prontas para serem apontadas e paqueradas. Confesso que sem papel, perco boa parte do meu poder (se é que o tenho) e fico sem chão. Confesso que tenho medo de caminhar sem palavras escritas. Porém, confesso que ganho asas e sete céus se escuto certas confissões da boca da minha mulher-anjo. A ela, confesso-me amor.

Confesso que amo muito, mas sinto que esse amor ainda tem ainda muito a crescer e a se desenvolver. Quando acho que cheguei ao ponto máximo, descubro que é possível superá-lo. E confesso que isso me inquieta e essa inquietude dá sentido a minha vida. Confesso o meu romantismo, mas preciso esquecer os problemas do mundo lá fora e ser romântico por inteiro. De nada vale ser romântico 99 por certo. É preciso ser 100 por cento ou mais do que isso - é essa busca que concede significado a minha existência. Afinal, a falta de limites é a confissão explícita do meu amor. Tenho consciência de que a realidade insiste em me podar, em me embarrerar com muros altíssimos, em criar fossos com jacarés e outras feras ao redor de mim... Confesso que, as vezes, tudo isso me deixa fraco. No entanto e para tanto encanto, confesso que, diante do pão e do cálice da poesia, renasço da minha própria morte.

Confesso que devia ler mais. Ando lendo muito pouco. Vinícius de Moraes que me perdõe, mas não tenho respeitado as doses homeopáticas de sua poesia. Confesso que queria ser poeta e viver de poesia. Confesso que devia andar mais descalço. Estou na ditadura do sapato. Estou sentindo tão pouco a terra, o mato, o mundo em si. Confesso que tenho aberto poucas porteiras, degustado poucas frutas no pé, bebido pouca água na mina. Para o meu modo de vida, esses são pecados gravíssimos. Confesso que tenho dormido demais, trabalhado demais, exigido demais e isso tem feito o planeta girar rápido demais. Confesso também que estou em falta com minha inspiração. Tenho mais idéias e sentimentos do que tempo para colocá-los no papel. Isso é um crime gravíssimo, ao menos, para mim. Ah! Como eu queria escrever um livro por dia, por semana, por mês que fosse. Confesso que as vezes, sem qualquer blasfemia, queria ser Deus para controlar o tempo. Ao menos, o meu tempo.

Confesso que devia reclamar menos e ser mais tolerante, com mais paciência. Confesso que as vezes tenho vontade de ir para a lua jogar conversa fora com São Jorge. Confesso que não suporto mais certas coisas, como a burrice ou o ceticismo humano. Confesso que preciso tirar mais minutos do meu dia para ouvir os pássaros de Tom Jobim. Confesso que preciso conversar mais com o Senhor de todas as coisas. Confesso que preciso agradecer mais detalhe por detalhe da minha vida. Confesso que preciso abraçar um mundo por vez (estou com o vício terrível de querer ter todos os astros e signos em mim). Confesso que estou em dívida com meu anjo da guarda, que está sempre a postos. Confesso que preciso parar diante de cada milagre e ver o quanto sou agraciado. Confesso que queria ser mais e mais, mas sou apenas eu. E este eu está de bom tamanho. Um eu, poeta e apaixonado, que se confessa aqui.


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