Coisas de torcedor
Hoje é domingo. E domingo de final de Copa do Mundo. Domingos assim só acontecem de quatro em quatro anos. E daí! Grande bobagem. Ainda mais quando o leitor sabe que o escritor aqui não é dos mais apaixonados por futebol. De fato, não sou a melhor pessoa para fazer análises sobre o jogo de hoje. Por isso, vou falar de você aí do outro lado.
Hoje o país (ou quase todo o país) é uma enorme massa verde-amarela. E no meio dessa massa, lá está o torcedor brasileiro. Um torcedor que não tem nome, não tem cor, não tem idade, não tem sexo, enfim, não tem nenhuma daquelas respostas computadas pelo Censo. É apenas mais um. E lá vou eu buscar um modelo clássico de torcedor. Por isso, não me importa os dados específicos acima. Busco um torcedor geral, ou melhor, genérico. E como o remédio genérico, o torcedor genérico só aparece em momentos estratégicos.
Hoje o torcedor genérico, que é muita propaganda e muita torcida, acorda assobiando o hino nacional. E já acorda com a camisa da seleção. Levanta com o pé direito e apela para todos os santos e simpatias. A casa deve estar cheia de bandeirolas do Brasil penduradas para tudo quanto é canto, inclusive no corpo do nosso torcedor. Vai mais cedo comprar pão e arrisca um palpite no bolão do dono da padaria. É hoje!!! Quando volta para casa, solta três rojões seguidos, que é para ter certeza de que acordou toda a vizinhança. É a sua boa ação do dia. Ansioso, liga a TV e começa a se concentrar com o não menos torcedor, Galvão Bueno. Em pouco tempo o coração vai entrar no ritmo da batida dos tambores do Olodum. E antes de começar o jogo, o torcedor vai dar uma sambadinha esquisita em frente a TV. Não por acaso, fã do Rubinho. Brasil x Alemanha. Xô Shumacher!!!
Hoje, nada mais importa além do jogo. O torcedor não vai querer saber quanto está o risco-Brasil (aquele índice que os governistas criaram e não sabem o que fazer com ele). Cotação do dólar? A única cotação que pode aparecer hoje é a da arroba do boi gordo, se tiver Globo Rural. Hoje, não importam as armações do governo, mesmo que levem o país à deriva. Até então, nenhuma surpresa. Em caso de vitória, será normal se FHC quiser uma medalha. Mas o torcedor não pode deixar isso acontecer. Afinal, na lista de não convocados do Felipão: FHC, Serra e Rita Camata. E entre os não convocados, sou mais Romário.
Hoje é domingo. E domingo não tem horário político. Então, chega de política. Mas futebol é política. Uma política disfarçada, ou não. Tudo bem leitor, basta de política. Voltemos ao nosso torcedor genérico. Lá está ele sentado em frente à TV com cara de tartaruga de propaganda de cerveja... iiihhh!!!! Mas para quem não gosta de cerveja, tem o Pelé na propaganda de um refrigerante não menos famoso. Beba isso, beba aquilo e torça para o Brasil. Estranho, não? Mas o torcedor vai estar tão hipnotizado com o nacionalismo da TV Plim-Plim que nem vai notar que tem gringo no samba, ou melhor, no futebol. Será outra colonização? A nação, a seleção, e nós colonizados por marcas e logotipos. Iiiihhhh!!!
O estádio lotado. Japão. O torcedor queria estar lá, mas o dinheiro não deu. Desde a Copa de 90 a situação não era das melhores, mas depois da Copa de 94 ela piorou e muito. Foi uma derrota atrás da outra. Perdeu a poupança, perdeu o talão de cheque, perdeu o emprego, perdeu a casa própria, perdeu o carro, perdeu o plano de saúde. E pior, não se pode culpar o Zagallo. Infelizmente o nosso torcedor tem que engolir outros caras. Porém, continua confiante e acredita que na próxima Copa vai estar lá cantando: "eu sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor". Fez pedido até para uma certa estrela cadente. Coisas de torcedor.
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