Daniel Campos

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28/10/2016 - Choro de ninguém

Acostumei a chorar como choram as árvores, um choro quieto e camuflado, ora seiva ora orvalho, que serve como alimento para as novas folhas. Choro é sinônimo de renovação, de mudança, de nascimento e, sem dúvida, de crescimento. Ninguém cresce ou amadurece sem lágrimas. Porém, tenho o cuidado de não deixar gosto algum de choro nos frutos que ofereço, pois ninguém merece se alimentar da minha tristeza. Aos outros, por mais triste que esteja, devo oferecer o que tenho de mais doce, forte e belo. Que venham as flores porque florir é um outro jeito de chorar. É um chorar colorido, perfumado, bonito. Quem disse que o choro precisa ser sinônimo de dor? O meu choro é o meu sustento, é o que me faz ter a certeza de que preciso de raízes cada vez mais firmes para sustentar tudo o que eu amo, o que eu sonho, o que eu desejo.

O meu choro é chuva que o vento carrega gota a gota como sementes da minha poesia. E a minha poesia é lírica, apaixonada, romântica em toda sua extensão... quebra-se a casca e o choro vem à luz. Eu choro a saudade dos frutos que perdi antes deles completarem seu tempo. Eu choro as sementeiras que não brotaram. Eu choro o romance cravado em meu tronco na ponta do canivete do destino. Eu choro por aquela que já quer mais subir em mim, se dependurar nos meus galhos, dormir na minha sombra. Eu choro por não poder sustentar o balanço ou a casa da árvore de quem vai nascer longe da minha copa. Eu choro por ter fincado raízes num só coração ao contrário de ter criado asas e partido para outras terras. Eu choro como choram as árvores, um choro que ninguém vê, que ninguém se importa.


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