Daniel Campos

Imprimir Enviar para amigo
Cheiro da chuva

Como é bom sentir o cheiro da chuva. Cheiro da chuva? Aprendemos na escola que a água matéria-prima da chuva) é inodora, ou seja, não tem cheiro. Então como explicar o aroma que se instala em nossas narinas quando acontece de chover?

Alguns dizem ser o cheiro da poeira presente no ar, na terra, ou ainda, fruto da poluição. Mas não o creio. Contrariando a química, a biologia, e os sabichões, afirmo: a chuva possui cheiro.

Clarões, nuvens negras, trovões... Vem o cheiro de chuva e nos avisa dos primeiros pingos. O aroma que a anuncia é diferente do odor que fica após a chuva. O primeiro aroma é mais rústico, invade nosso pulmão sem pedir licença, chegando a ter notas secas. O segundo é o mais intenso, aquele que cala fresco e doce, mas com direito a uma brandura infinda. Quando a chuva acontece em sua plenitude, o aroma que invade o nosso buquê nasal é a mistura entre o rústico e o fresco, entre o seco e o doce, entre o autoritarismo e o delicado.

Não digo que as nuvens contenham perfume de nascença. Se o passam, escondem a marca, como as mulheres que se perfumam. O cheiro de chuva me parece naturalmente meio humano meio deus. Um cheiro refinado, envolvente, conhecido, mas com todas as doses de mistério. Será o suor das estrelas? Se o for, quero, desde já, embrenhar-me nas axilas estelares.

Segundo a minha teoria, as nuvens roubam o perfume das mulheres. Enquanto elas dormem, as nuvens claras, quase invisíveis, repousam sua maciez sobre o corpo das mulheres e se mancham de perfume. Ao choverem, misturam as essências, tingindo a chuva de aroma feminino. Ou, às vezes, chovem uma só mulher. Quem nunca se banhou na chuva e sentiu o cheiro da mulher amada naquelas gotas que me atire o primeiro relâmpago.

Particularmente, a minha chuva é uma mistura cítrica de sândalo com patchoulli. E com algumas orquestrações de morango. E há qualquer coisa de anjo nisso tudo. Podem achar que estou divagando, mas prefiro crer que a chuva tem perfume de mulher a achar que ela tem o fedor da poluição atmosférica. Aliás, poluídos são os sentimentos de quem nunca amou sob chuva. Que os céticos me perdoem, mas que venham os ventos como bois de carro puxando as nuvens de chuva porque eu quero amar nasalmente a mulher amada.


Comentários

Nenhum comentário.


Escreva um comentário

Participe de um diálogo comigo e com outros leitores. Não faça comentários que não tenham relação com este texto ou que contenha conteúdo calunioso, difamatório, injurioso, racista, de incitação à violência ou a qualquer ilegalidade. Eu me resguardo no direito de remover comentários que não respeitem isto.
Agradeço sua participação e colaboração.

voltar