Daniel Campos

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29/10/2011 - Cem anos de Nelson Cavaquinho

Cem anos daquele que viu os barracos como castelos. Cem anos daquele que nunca viu uma criança nascer sorrindo. Cem anos daquele que pisava em folhas secas. Cem anos daquele que em seu jardim só colheu saudade. Cem anos daquele que percorreu os degraus da vida. Cem anos daquele que atrasava o relógio para enganar a morte. Cem anos daquele que queria roubar as gotas de luar dos olhos da criatura amada. Cem anos daquele cuja voz rouca ainda arranha nossos ouvidos.

Cem anos daquele rei vadio. Cem anos daquele que descobriu que nem todos são amigos. Cem anos daquele que sabia que um palhaço chorava por alguém que não o amava. Cem anos daquele soldado do samba. Cem anos daquele que nos contou como é o pranto de um poeta. Cem anos daquele que não queria vingança. Cem anos daquele que descobriu outra afinação e outro jeito de tocar violão. Cem anos do parceiro de bambas como Cartola, de Guilherme de Brito, de Zé Keti. Cem anos do boêmio que passou quatro noites sem comer ou dormir, apenas bebendo.

Cem anos daquele que cantou o juízo final, a história do bem e do mal. Cem anos daquele que andava sempre só, na luz negra de um destino cruel. Cem anos daquele que avisou que partiria sem saber se voltaria. Cem anos de refinamento, de lirismo. Cem anos daquele que versava que seu único fracasso estava na tatuagem de seu braço. Cem anos daquele que foi sempre Mangueira. Cem anos daquele que se fingia de alegre para ninguém ver seu choro. Cem anos daquele que quando se chamasse saudade queria preces e nada mais.

Cem anos de Nelson Cavaquinho.


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