Daniel Campos

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11/05/2008 - Carta a uma menina

Cara menina Isabella,

Hoje, mais do que qualquer outro dia, você deve sentir vontade de abraçar e ser abraçada. Sentir desejo de dizer "eu te amo" para alguém e ficar junto e se sentir protegida. Não sei o que lhe dói mais: se as marcas de mãos feitas no seu pescoço por aquela mulher que se dizia sua mãe ou o choro quieto de sua mãe? Embora existam centenas de anjos ao seu lado, meninos e meninas mortos pelos próprios pais ou por alguém próximo, a solidão deve arder seu pequeno coração. E sua mãe não está perto, o quão perto gostaria, para soprar esse ardor. Deve ser difícil entender.

Há muito tempo, uma mãe também não conseguiu entender muita coisa ao ver seu filho ser humilhado, preso e crucificado. Alguém que só fazia o bem tinha de pagar pelos pecados alheios. Mesmo sem entender, Maria, de mãe de Jesus, passou a ser mãe da humanidade. Um sentimento semelhante ao seu, que passou a ser filha de muitos. Muitos choraram você, se indignaram e quiseram fazer justiça por você. É difícil compreender que depois de dois mil anos, homens e mulheres sejam capazes de atos de selvageria típicos do início dos tempos.

A humanidade parece não ter aprendido nada. Caminha na linha do egoísmo, do matar para tirar proveito próprio. O outro não importa, o que interessa é se dar bem. Nem que para isso madrasta e pai precisem se unir para jogar a própria filha pela janela do sexto andar de um prédio. Penso na dor de sua mãe ao imaginar seu rosto sangrando. Penso na dor da sua mãe ao imaginar seu corpo sendo entregue à morte em queda livre. Penso na dor da sua mãe ao imaginar seu grito sufocado pelo desmaio. Penso na dor da sua mãe ao imaginar suas mãos deixando um rastro de impotência na parte externa do prédio. Penso na dor da sua mãe ao lhe ver no jardim, como uma flor caída. Penso na dor.

Penso na sua dor ao se encontrar sozinha. Penso na sua dor por não esperar a morte de onde ela veio. Penso na sua dor ao ver o choro de hipocrisia e o choro verdadeiro rodeando seu corpo. Penso na sua dor ao não conseguir voltar para o corpo. Penso na sua dor por não poder estancar as lágrimas da sua mãe. Penso na sua dor ao ver que sua mãe não conseguia mais lhe ver. Penso na sua dor por não ter tido força para evitar tanta dor. Penso na sua dor por não poder, como em anos anteriores, acordar sua mãe com abraços, carinhos e desejos de um dia feliz. Penso na dor da sua mãe e de tantas mães que não podem mais abraçar seus filhos, ouvir a voz de seus filhos, coloca-los no colo. Penso na dor de tantas mães que tiveram suas vidas, carne de sua carne, abortadas pelo destino dos homens.

Hoje é Pentecostes. Mas mesmo as línguas de fogo não conseguem acabar com tanto sangue derramado. Hoje é Pentecostes. Mas mesmo o vento não consegue varrer tanto ódio, tanto egoísmo, tanta ganância. Hoje é Pentecostes. Mas mesmo a pomba voando nos altos céus não consegue indicar um caminho para uma humanidade que só olha para o próprio umbigo. Hoje é Pentecostes. Mas mesmo o Espírito Santo descendo sobre todos não consegue se infiltrar em homens e mulheres que criaram uma couraça de anti-sentimento em torno de si próprios. Hoje é Pentecostes. Há mais de dois mil anos, Maria estava com os apóstolos, quando recebeu a visita do espírito de seu filho vivo. Sob os olhos da mãe da humanidade, fundou-se um novo tempo.

Um tempo muito mais espiritual baseado no amor e na paz. É uma pena, cara menina Isabella, que boa parte da humanidade ao contrário de cultivar, prefira abortar o amor e a paz. Quem sabe um dia, quando você voltar, o mundo esteja um pouco melhor. Quem sabe. Por enquanto, ao lado desta que entregou seu filho às centenas de gerações de homens e mulheres, tenha, com todo o poder da palavra, um dia especial.


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