30/03/2010 - Capítulo 7
Por um fioDe repente, o choro se transforma em raiva. Ignorando Micaela, Sebastian sobe as escadas à procura de Malena, que se maquiava para ir ao trabalho. Sem maldade, ela pergunta como foi sua conversa. Ele, transtornado, passa a mão pela penteadeira e joga pentes, cremes e estojos de maquiagem ao chão.
Enquanto ela se recupera do susto, ele esbraveja dizendo que ficou sozinho em um momento difícil. Aos berros, frisa que há tempos ela o tem deixado só, desamparado, abandonado...
As discussões recomeçam com ânimo revigorado:
Malena o chama de grosso, diz que ninguém tem o direito de gritar com ela e que era ele quem tinha de resolver tudo aquilo. Afinal, ela não era amiga do padre, tampouco admiradora da madre.
Ele conta da expulsão de Micaela e de sua proibição de entrar na igreja. Ela pergunta se os dois falaram alguma coisa com sua filha, se a ofenderam. Mas quem se ofende é Sebastian:
- Você só se preocupa com sua filha. E a humilhação que eu passei?
- Eu lamento, mas foi você quem procurou essa situação. Eu preferia que nada disso tivesse acontecido, mas que isso lhe sirva de lição.
- Lição? Você acha que quem deve pagar pela falta de educação de Micaela sou eu?
- Quer saber... Não vou recomeçar essa conversa. Nunca saímos do lugar mesmo.
Ela dá as costas ao marido e volta a se maquiar. Sebastian a pega pelos ombros com brutalidade e volta o olhar da mulher para ele, chegando a machucá-la.
Malena sacode os braços e grita:
- Nunca mais faça isso. Eu não sou sua marionete. Vai fazer isso com aquelas outras que você anda.
- Que outras mulheres?
- Você sabe muito bem do que estou falando.
- Acha que estou lhe traindo, que tenho outra? Até algumas semanas atrás você confiava cegamente em mim, agora além de desconfiar tem raiva.
- Eu tenho motivos para isso, não tenho?
- O que foi que eu fiz?
- Você sabe muito bem o que fez!
- Sei?! Isso é o que você acha.
- Você não me trata com o romantismo de antes. Você me bate. Você recebe telefonemas misteriosos. Você olha mulheres na rua diante dos meus olhos. Você vive de conversinha com suas colegas de trabalho. Você, nos últimos tempos, anda disperso e agressivo demais. Você não me respeita e também não respeita meus filhos, minha mãe, minha irmã, meu sobrinho, minha empregada...
Sebastian nega as acusações, diz que ela está enganada, que está sendo envenenada pela irmã e, sem ter sua defesa atacada, senta-se no chão após escorrer suas costas lentamente pela tinta esverdeada da parede.
Ela, tremendo de ódio, silencia e continua se maquiando. A maquiagem ganha tons mais fortes. Parece se pintar para a guerra, mesmo querendo paz. Enquanto isso, algo o inquieta, o atenta, o embravece até que faz o que não quer fazer.
Eis que ele pega um vidro de perfume e atira contra o espelho. O reflexo de Malena é partido em mil pedaços. As discussões se reascendem de forma violenta até que se transformam em beijos e pedidos de perdão. É como se algo os levasse a brigar, mas que o sentimento que nutrem um pelo outro falasse mais alto.
No entanto, não sabiam até quando esse sentimento prevaleceria. A união dos dois estava por um fio. Brigavam por tudo e a todo instante.
Enquanto ele ajeita a gravata, ela pergunta pelos outros. Sebastian diz que dona Valentina havia saído cedo, certamente para ir ao centro já que é dia de ela distribuir água fluidificada. Tomás estava jogando videogame no quarto e Micaela, da última vez que a viu, estava vestida como uma vagabunda aos pés da escada.
Ela se irrita com a adjetivação depreciativa da filha, mas antes que uma nova troca de farpas viesse à tona, ele a cala em um beijo farpado de desculpas. Ela diz que já está farta de pedidos de perdão e que ele precisa mudar. Ele pede que ela se acalme, pois está vivendo dias difíceis, mas fará de tudo para melhorar o casamento e a vida em família.
Malena sorri timidamente como que aceitando a contragosto mais uma promessa. Mais uma vez, os dois se desculpam e se beijam e dizem que se amam.
Antes de fechar a porta, pergunta novamente se ela não conhece aquele homem negro e alto que ficou posicionado bem embaixo da porta da igreja ontem. Diz que o rosto dele não lhe sai da cabeça.
Ela acha que ele deve ter ficado impressionado com a situação, que o homem devia ser apenas um parente ou conhecido de alguma aluna. Mudando de assunto, Malena conta que mais tarde irá procurar outro colégio para a filha e uma escola de música para o filho.
Quem sabe tais mudanças contribuam para apaziguar a revolta dos dois.
Sem forças para revidar, Sebastian sorri e lhe deseja boa sorte. No entanto, sai do quarto derrotado, esmorecido. Depois das discussões diárias as olheiras de quem pouco dormiu durante a noite marcam profundamente seu rosto.
Ele abre a porta da sala e esbarra em Alicia, que entra com o filho a tiracolo e com um ar cínico no rosto, pronta para falar mal dele para Malena. Sebastian respira fundo e fecha a porta sabendo que sua paz conjugal está por um fio.
Observação do autor: Próximo capítulo: 01/04 (quinta-feira)
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