Daniel Campos

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Caminhos

Eu caminho, tu caminhas, nós... A vida é feita de caminhos, caminhadas, caminhantes. Caminhos feitos de terra, de pedra, de mar, de céu, de mato, de fogo. Caminhadas feitas de procuras, esperas, encontros. Caminhantes feitos de sonhos e lembranças.

Nessa caminhada, independente dos acontecimentos, segue-se em frente. Nesse caminho não se vê muito adiante, uma espécie de cerração toma nossos olhos, portanto, sonhar é uma questão de sobrevivência. Os passos podem ser lentos ou apressados, estreitos ou largos, firmes ou fracos, mas são para frente.

Infelizmente, não se pode voltar e para viver de adeuses é necessário sofrer de uma dor constante, de uma morte lenta e sofrida. O ideal é seguir em frente e levar conosco o que não se quer deixar. E não é de se espantar se nos tornarmos carregadores de lembranças. Uma frase, uma música, um abraço, um sabor, um gesto, um lugar, um animal de estimação. Lembranças que permitem que a estrada não seja um deserto. Todavia, que isso não impeça a aparição de miragens. Quando o dia tiver que amanhecer sem aquele bom-dia; quando andarmos sem a companhia daqueles passos; quando mesmo com milhões de flores pelo caminho, notarmos a falta daquela flor as lembranças se tornam fundamentais.

O caminho parece ser um só, mas só parece. Se forem tantos os encontros, tantos serão os desencontros e tantas serão as vontades dos reencontros. Caminhos que se separam, que se dividem, que desaparecem sem obedecer aos nossos quereres. O sol tombado sobre as minhas palavras pode ser a mesma lua debruçada em seus olhos, cansada de separações.

Caminha-se e embora nós tragamos tanto, ficamos um pouco pelo caminho. Dos tantos sonhos que tínhamos, tantos deixamos de sonhar; das tantas histórias que contávamos, tantas ficaram em silêncio; dos tantos enigmas que tentávamos decifrar, tantos desistimos de entender; das tantas coisas que achávamos importantes, tantas não fazem mais sentido; dos tantos segredos que guardávamos, tantos ninguém mais quer descobrir; dos tantos amores jurados para sempre, tantos deixamos de amar...

Num dado momento, que nunca é exato, o peito sufoca em sonhos e os ombros envergam em lembranças. Surge uma vontade de gritar, de parar, de se esconder. São tantos sentimentos. Então, eis que se ajoelha e chora. Os relógios continuam com suas voltas. Chora-se uma despedida, chora-se uma ilusão, chora-se um desejo louco de voltar, entretanto, as lágrimas não são eternas e as que ficam logo escapam pelas nossas mãos e nos olhos, ainda úmidos, surge uma estrada que continua em tantos relevos.

A vida não é só uma reta, se o fosse não teria graça, encanto, charme. O nosso caminho é feito de retas, esquinas, cais, penhascos, alamedas, ladeiras, parábolas. Alguns andam, alguns dançam, alguns rastejam, alguns voam. Caminhos se cruzam, passos se entrelaçam. Se a vida fosse só uma reta, se a vida tivesse só um passo... Estaríamos condenados à solidão perpétua.

Para viver por inteiro é preciso saber caminhar e se deixar levar pela paixão. Ter cada passo adiante como um nascimento e ter um gosto diferente em cada passo deixado para trás. É preciso que entre tantos passos, encontre-se uma razão para continuar. E que cada passo tenha um porquê, mesmo que nunca ninguém lhe peça para explicar esse porquê. Que nós, os caminhantes, sejamos infinitos em lembranças e sonhos. E que os sonhos, antes de se tornarem lembranças, tenham uma vida intensa. Eu caminho, tu caminhas, nós...


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