08/01/2011 - Belmont
Lembro das vezes que na calada da noite eu descia, vigiado pelos olhos de meu avô, a Rua São Miguel. Ia me espreitando pelas calçadas de pedras portuguesas e atravessava a esquina que dava acesso à Rua Santos Dumont guiando-me pelo som das tacadas das mesas de sinuca do bar do Furigo. Um bar feio, freqüentado por uma gente feia e por uma feiúra de espírito. As luzes amareladas iluminavam as garrafas velhas que ficavam empoleiradas sobre o balcão. Era naquele ambiente que buscava espaço entre um bêbado e outro me equilibrando na ponta dos pés para pedir uma carteira de cigarros.
Meu avô não fumava qualquer cigarro. E naquela época ele estava encantando com o Belmont. O nome era pomposo e a embalagem também. Tons de dourado, azul marinho e vermelho, com dois leões segurando uma coroa. Era plasticamente muito bonita. Eu pegava o cigarro e sai em disparada. Não gostava da cor, do cheiro, do som daquele bar. Existiam outros bares mais agradáveis ou tão repugnantes quanto espalhados por aquela redondeza, mas só havia Belmont no tal bar do Furigo.
Os anos se passaram e meu avô deixou de fumar, nunca mais entrei no bar do Furigo ou ouvi falar nessa marca de cigarros. Mais anos se passaram e meu avô partiu, mudei-me de cidade e nunca mais vi uma carteira desse cigarro. No entanto, jamais esqueci seu nome. Para mim, o nome Belmont vai além do universo dos cigarros e do nome de um dos integrantes de uma música caipira. É um lugar bonito com direito a muito verde, cavalos e montanhas. Um dia ainda vou escrever um romance em que o nome da cidade seja Belmont. Promessa de ano novo.
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