Daniel Campos

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04/06/2010 - Ainda lá

Lá e ainda lá é possível respirar o cheiro de capim molhado impregnado no ar. Lá é permitido desenhar com os pés na terra orvalhada. Ainda lá os pássaros fazem poleiro das galhas de um coqueiro. Lá e ainda lá as santas têm andores de madeira no canto da sala. Lá e ainda lá a vida segue em charretes. Lá as calças rasgadas são remendadas em pedaladas de uma máquina de costura. Ainda lá as bocas têm gosto de ingá. Lá e ainda lá o coração de quem ama é de tafetá.

Lá e ainda lá a chuva nos empurra para debaixo da coberta. Lá até o estômago barulha em som de seresta. Ainda lá é possível fazer festa todo dia com o nascimento de um bezerro, de uma estrela, de uma cotovia. Lá e ainda lá poesia se pega no anzol e o céu está livre do besteirol da televisão. Lá a boneca tem cabelo de espiga de milho e o romance tem mais tomilho. Ainda lá a gente se encanta e espanta com tanta crendice. Lá e ainda lá o amor nos choca sobre as asas da boa e velha caipirice.

Lá e ainda lá tem noivinha e viuvinha saracoteando pelo terreiro. Lá mãe de maio é nada mais que uma flor. Ainda lá o velho ditado é sempre um novo aprendizado. Lá e ainda lá o ouro é de trigo, a prata de lua e a rua de terra. Lá tem formiga de doce e siriri que o vento trouxe. Ainda lá tem dente de leite, paixão de ramalhete e foguete de São João. Lá e ainda lá a gente vai se encontrar.


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