Daniel Campos

Imprimir Enviar para amigo
04/05/2012 - Adeus, Adeus Tinoco

Hoje, o Chico Mineiro chora. Hoje, a Cabocla Tereza amanheceu de luto. Hoje, a Tristeza do Jeca é ainda maior. Hoje, a Viola Cabocla segue quieta. Hoje, a Moreninha Linda se enche de saudade. Hoje, o Cavalo Preto, o Cavalo Branco e o Cavalo Zaino não galopam. Hoje, mais do que nunca, o canto triste da Siriema de Mato Grosso nos faz chorar. Hoje, A Sanfona do Mané vai ficar calada num canto. Hoje, o Velho Carreiro deixa de carrear. Hoje, quem procurar A Moda da Mula Preta, o Baile na Roça e o Luar do Sertão vai encontrar um vazio doído. Canta, Canta Moçada que hoje é dia de Adeus, Adeus.

Morreu Tinoco.

E com ele, morreram cateretês, guarânias, valsinhas, modas, emboladas, toadas, balanços, vaneirões, mazurcas, congadas, canções, valseados, catiras, batidões, canas-verdes, querumamas, cururus, poemas, polcas, declamações, rasqueados, pagodes, sambinhas, rancheiras, xotes, recortados, quadrilhas, dobrados, balanceios, marchinhas, folias, desafios de cantadores...

Eu tenho sangue caipira e alma violeira. Assim que nasci, fui embalado por meu avô no melhor de Tonico e Tinoco. Ponteei a dupla tantas e tantas vezes no meu violão menino. Rabisquei muito papel com a fantasia dos sertanejos. Perdi a conta do quanto enchi os olhos com meu avô Liberato dançando ao som de Tonico e Tinoco. Também não sei calcular o número de vezes que peguei meu outro avô, Antônio, cochilando ao lado de um radinho que gostava de tocar Tonico e Tinoco. Juntos, vivemos muito do que aquela dupla cantou.

Eu vivi Tinoco, na verdade, vivi Tonico e Tinoco nos carros de boi gemendo no estradão, nas manhãs estaladas por canários, nas pastagens orvalhadas, no chuá chuá das águas, no ar puro das invernadas, no boiadeiro tocando sua boiada, nos cafezais em flor, no vento que faz o mato dançar, nos bailes na tuia, nas noites de São João, nos aboios do entardecer, na prosa boa na beira de um fogão à lenha, no balancê, balancê das coisas do coração, na toada do mundo velho sem porteira, no evangelho da vida campeira.

Hoje, Tonico e Tinoco, Liberato e Antônio, e uma boa parte de mim, estão juntos na beira da tuia, bem no meio de uma plantação de arrasta-pé.


Comentários

20/07/2013, por Rubens D:

Engraçado que tantas coisas boas se perdem e parecem que pouca gente nota, cada inutilidade tão grande, com tantos destaques....mas afinal...."


Escreva um comentário

Participe de um diálogo comigo e com outros leitores. Não faça comentários que não tenham relação com este texto ou que contenha conteúdo calunioso, difamatório, injurioso, racista, de incitação à violência ou a qualquer ilegalidade. Eu me resguardo no direito de remover comentários que não respeitem isto.
Agradeço sua participação e colaboração.

voltar