Daniel Campos

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Abacateiro

Lá no sítio, no terreiro da primeira casa de um recém-casal, um abacateiro é testemunha do casamento que completa hoje cinqüenta anos. Há 50 anos, um casal chegava de mãos dadas naquela terra vermelha, onde casariam seus destinos, suas lutas, suas vidas. Nesses 50 anos, quantos galos cantaram pra eles a chegada de um novo dia. Quantas valsas seus corpos rodopiaram ao longo desses 50 anos. Quantas roupas foram colocadas pra quarar. Quantos almoços foram feitos em plena madrugada. Quanto de suor foi derramado por esses rostos. Ao longo desses 50 anos, quantas vezes esses lábios choraram e esses olhos sorriram. Quantos sonhos queimaram à luz de um lampião. Quantas vezes a égua Faísca os levou pela estrada afora. Quantas plantas, quantos animais, quantas pessoas fizeram parte de suas vidas ao longo desses 50 anos. Quantos foram os encontros e quantas foram as despedidas. Quantas dificuldades, quantas saudades, quantas vontades se misturaram ao longo desses 50 anos. Quantas vidas germinaram dessas mãos no decorrer desses 10, 20, 30, 40, 50 anos. A cada novo ano completado, uma nova semeadura, uma nova floração, uma nova colheita. Quantos dias nasceram, lado a lado, por entre o ubre das vacas. Quantos dias anoiteceram, lado a lado, na brasa do fogão. Quanta fé, quanta devoção, quanta reza ao longo desses 50 anos. Assim como o tronco daquele abacateiro, as mãos que agora recebem as alianças de bodas de ouro guardam marcas que o tempo não conseguiu esquecer. Mãos de Liberato e Adélia. Mãos de seu Líbio e dona Délia. Mãos de trabalhadores que cuidam da roça e cuidam da casa. Mãos de vencedores que cuidam dos filhos, dos netos e agora, de um bisneto. Mãos de sonhadores que cuidam um do outro, num amor à moda deles. 50 anos depois, mesmo com os galhos mais retorcidos e com as folhas mais desbotadas, aquele abacateiro oferece seu tronco para que a vida escreva ali mais uma página da história de ouro de um casal feito de terra, de esperança e de amor.

Observação do autor: Texto em homenagem ao aniversario de cinqüenta anos de casamento dos avós maternos de Daniel Campos ( Liberato e Adélia Barbosa). Em comemoração, o texto foi lido no dia 03 de setembro de 2006 durante missa especial na capela de Nossa Senhora do Mont


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