Daniel Campos

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14/05/2011 - Tristeza copiosa

E ela não falou mais nada. Calou-se entre suas tantas dúvidas num quarto de travesseiro. Não queria falar ou ouvir palavra alguma. Apenas ronronava baixinho, como uma felina à luz da lua. Ficou ali de olhos fechados, de lábios trancados, de sonhos vendados. Ficou ali como ficam as estrelas na noite escura – queimando a própria solidão. E ao contrário de lágrimas, seus olhos vertiam uma espécie de cera que, pouco a pouco, deixava seu rosto com as feições de uma boneca de porcelana.

Era uma tristeza pungente. Sofria as dores das flores de inverno. Sofria por não poder abrir a janela e voar com asas próprias. Sofria pelos sonhos que morriam sem que ela pudesse fazer nada para impedir. Sofria porque queria ir, quando tinha de vir. Sofria porque precisava parar, quando queria continuar. Sofria porque queria ser apenas ela, sem mais construções. E isso não lhe era permitido pelos senhores de sua vida – o destino e o tempo.

Não adiantava enfrentá-los, tampouco fugir de suas diretrizes. Restava-lhe apenas fingir-se de morta, num choro de expurgo. Durante o dia, sobrevivia como podia. Durante a noite, sofria num choro que ardia. Deitava nos braços da ilusão, que lhe acariciava com mãos violeta, como uma ave caída, machucada e desprotegida. Se pudesse, dançaria até desfalecer nos braços de seu príncipe encantado. Mas a essa altura dos acontecimentos, ela não sabia se podia confiar num conto de fadas.


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