Daniel Campos

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15/08/2010 - Restos do apocalipse

Todos correram. Todos fugiram. Todos sumiram das ruas e das luas de São Jorge. Não há ninguém por aí. Não há ninguém por aqui. Mataram todos os pardais, os rouxinóis e até o mestre bem-te-vi. Não há canto de pássaro, não há ninho de pássaro, não há céu de pássaro e não há ninguém a passar. Destruíram todas as flores. Borraram as cores. Saquearam as lojas. A comida acabou, a policia debandou, a festa acabou... e eu fiquei para trás acreditando no mundo, nas coisas do mundo...

Beberam todo o champanhe. Quebraram as taças de vinho. Sujaram a água da fonte. De avião, navio, carro, moto... todos se foram. Não ficou ninguém para dar notícias. A televisão saiu do ar. O rádio está mudo. Os bares estão vazios. A cidade é só uma massa de concreto e nada mais. Tudo está escuro. As árvores secaram, tombaram, queimaram. E não há qualquer sinal de brotos. Só as formigas continuam sua marcha prevendo um longo inverno.

Tantas histórias de amor se acabaram. Tantas paixões não resistiram. Tantos deixaram de lado as criaturas amadas tentando se salvar. Corações machucados, assustados, desmascarados. Tudo é vazio em meio a um rastro de lixo. Há pés de sapatos jogados pelas sarjetas, relógios, celulares, chaves, papéis... Em meio a esse cenário de caos e abandono, o vento remexe com as palavras de um papel que ficou enroscado nas grades de um bueiro:

Depois do rompante
De um amor nuclear
Hei de encontrar
Os estilhaços de seu sorriso
Em algum lugar
Deste tempo amante
E sem juízo
Daí então
Mesmo sozinho e distante
Hei de colar
Cada pedaço da sua boca
A minha saudade louca...


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