Daniel Campos

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Presente

A luz do abajur se espalha cansada. Os olhares não sabem se ficam nos ponteiros vagarosos do relógio ou nas bordas do horizonte escuro. Na verdade, ficam nas tantas coisas que ficaram e não eram para ficar. Uma sede de amanhecer. De se encontrar com o novo. Mesmo que o novo se resuma a uma folha de calendário. Não importa. A possibilidade de se livrar desse tempo presente traz-me um certo alívio. Aos pés da cama, alguns frascos de remédio. Calmantes. As doses aumentam, noite a noite, mas de pouco valem. O corpo parece hipnotizado, tomado por uma espécie de insônia. Os discos são os mesmos da noite anterior. As páginas dos livros são as mesmas de anteontem. Até os passos que riscam o piso são os mesmos de duas ou três semanas atrás. Não se sabe mais se é calor, ou febre ou qualquer coisa que faça mal. Perdi a conta das vezes que o corpo entrou debaixo do chuveiro. Mas até a água parece ser a mesma das vezes passadas. Não existe nenhum sentimento novo rondando no ar. Até os olhares são os mesmos. Os mesmo olhares nascem em outros olhares como um filme que não valeu. Mas quem sabe, quando o dia amanhecer, o mundo seja diferente. Quem sabe, quando o dia amanhecer, a luz invada o útero daquele velho mundo e fecunde ali, outros sonhos, outros sabores, outros tempos.


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