Daniel Campos

Imprimir Enviar para amigo
04/01/2012 - Pranto de macaúba

Lá no fim da estrada tem um pé de macaúba, uma toca de coelho e a casa de uma viúva que fez votos com o silêncio. Lá, o mato passa da linha da cintura, o canário canta estalado, a lua parece um queijo do sertão. Lá pros fundos da mata corre um riacho com peixe bom. Tem história de curupira e de martim pescador. Quando chega o inverno, a geada cobre o campo numa invernada de trincar os ossos. A cadeira de balanço da varanda balança entre passado e futuro. Volta e meia do fogão a lenha da senhorinha sai um tabuleiro de bolo de fubá, uma caçarola de feijão e uma bacia de torresmo.

Quando maduros, os macaúbas cheiram longe. Um perfume doce que chega a melar na boca. Por debaixo daquela casca dura, uma semente de açúcar. Os cipós trançam na cerca e chegam a dar flor. Flores que se penduram nas ramas bordadas pela velhinha que vai perdendo os olhos para a catarata. A chuva cai mansa devolvendo cor à paisagem. Enquanto o cachorro mateiro se embrenha no brejo atrás dos coelhos, o gato ruivo se espicha na janela. Encostada na soleira da porta, a viola do velho descansa. Vez ou outra, o vento tira som de uma ou duas das sete cordas, arrancando dos olhos da viúva lágrimas de macaúba.


Comentários

Nenhum comentário.


Escreva um comentário

Participe de um diálogo comigo e com outros leitores. Não faça comentários que não tenham relação com este texto ou que contenha conteúdo calunioso, difamatório, injurioso, racista, de incitação à violência ou a qualquer ilegalidade. Eu me resguardo no direito de remover comentários que não respeitem isto.
Agradeço sua participação e colaboração.

voltar