Daniel Campos

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19/03/2011 - Ouvindo-se

Ouça. Ouça o que seus ouvidos não estão acostumados a ouvir. Ouça o seu corpo. Ouça as suas células se reproduzindo, seus pulmões se enchendo de ar, seus neurônios dando choque. Ouça seus pelos se ouriçando, seus beijos passados, seus pensamentos guardados. Ouça a sinfonia indiscreta e, ao mesmo tempo, secreta que é você. Ouça o silêncio em cada um de seus gritos. Ouça os movimentos ósseos e musculares. Ouça sua alma querendo sair do corpo. Ouça as corredeiras sanguíneas e os convites das linhas do destino que correm em suas mãos. Ouça suas unhas e cabelos crescendo num movimento quase que constante. Ouça sua anatomia transcendendo dos campos da física e da química para os terrenos da poesia.

Ouça as cantigas de ninar que seu sono entoa para você dormir. Ouça o choro das saudades que guarda em um baú. Ouça, ao desenrolar suas lembranças, o típico ruído daqueles filmes velhos. Ouça o barulho das correntes das fantasias e vontades acorrentadas. Ouça o que há de Mozart, Chopin, Villa-Lobos e Jobim em seu corpo. Ouça o roçar do espírito na carne. Ouça o frio e a quentura caminhando em direções opostas ao longo de sua estrutura. Ouça o grunhido dos desejos que esconde em uma entranha. Ouça a diferença rítmica que há entre o amanhecer e o anoitecer de seu corpo. Ouça seus leucócitos marchando em guerra. Ouça o tremor causado por um sentimento. Ouça o coração falando na língua dos cupidos. Ouça. Ouça-se.


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