Daniel Campos

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27/08/2008 - Canto em morte

Ò alma ferida minha, trovador que sou, canto a minha morte no silêncio destas linhas. Basta de viver. Basta de apanhar. Basta de chorar. Basta de acreditar que depois do horizonte haverá um amanhã melhor. Que amanhã é este que nunca chega? Ah! O horizonte é só um risco perdido no longe do céu. E não há mais tempo para se esperar milagres! E independentemente se paraíso ou inferno, se anjo ou demônio, se coragem ou covardia, o que eu quero é partir. Partir para bem longe daqui. Que aqueles que me apedrejam sejam coroados em face da lápide de minha ausência. Afinal, eu nada serei senão o meu próprio adeus. Adeus! Adeus! Adeus! Ah! Deus, onde estás que não o vejo?

Ò corvos famintos, eu os imploro, desçam de teus galhos para devorar a minha carne podre, que fétida os espera. Que meu corpo seja enterrado em cova rasa num lugar qualquer. Que a dimensão da vela seja proporcional a minha tristeza e queime, em uma chama uníssona, medo por medo. Chega de ter meu romantismo consumido pelas feras da inquietude. Que minha língua, não compreendida, seja devorada pelos primeiros vermes que surgirem a minha espreita. Que meu coração, que pulsa de amor demais, seja entregue a sua legítima dona - mademoiselle Marilene. Caso ela não o queira perto, que o joguem do vigésimo sétimo andar para que ele voe pela última vez. Ah! Meu coração sonhador, que sempre gostou de voar em meio às estrelas, pulsa seus últimos suspiros.

Quanto a ti minha poesia, espalhada em ramas de versos e prosas, vague mundo afora, sendo carregada pelos braços do vento como Pegasus selvagem. Que meus sentimentos, sempre tão fiéis, sejam condenados, esquartejados, aprisionados em um fundo de memória qualquer. Que a morte, em sua barca, venha me buscar e me conduzir pelos meus sete mares. Não quero levar nada deste mundo para qual dediquei o meu canto, o meu sol e a minha lua. Senhor rouxinol, chega de contracanto! Ah! Não deixarei saudade em ninguém. Portanto, não quero choro. Se alguém quiser chorar por mim, que o faça em vida. E não se preocupem em plantar flores sobre meu túmulo, posto que da minha decomposição há de brotar uma primavera de ilusão.


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